
Um levantamento sobre a Pré-Escola no Brasil apresentou novas evidências de que o acesso não basta. A análise destaca que a qualidade da Educação Infantil exerce influência decisiva no desenvolvimento e no aprendizado das crianças. O material reuniu achados científicos que explicam como ambientes pedagógicos bem estruturados fortalecem o desenvolvimento infantil em múltiplas dimensões.
O levantamento, feito pela Fundação Bracell, apontou um resultado central: crianças matriculadas em pré-escolas de qualidade atingem níveis de aprendizado significativamente superiores aos de crianças que não participam de iniciativas equivalentes. O ganho médio de 0,37 desvios-padrão, indicador internacional usado para comparar impactos educacionais, superou a média global (0,31) e ficou acima da média da América Latina (0,19). Avanços expressivos ocorreram em leitura, linguagem e desenvolvimento cognitivo. Programas de saúde escolar alcançaram impacto de 0,34 desvios-padrão e iniciativas de alfabetização e estímulo cognitivo chegaram a 0,28, patamar semelhante ao de países de alta renda.
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Eduardo de Campos Queiroz, diretor-presidente da fundação, avaliou que o conjunto de dados reforça a importância estratégica da Educação Infantil na trajetória das crianças e no enfrentamento das desigualdades. Segundo Eduardo, “Há décadas o Brasil amplia o acesso à Pré-Escola, mas pouco se sabia, de forma consolidada, sobre o quanto essa etapa impacta a vida das crianças. Agora confirmamos que esta etapa da Educação Básica, quando é de qualidade, faz toda a diferença. Uma Pré-Escola bem estruturada é essencial para as crianças, amplia as oportunidades de aprendizado, influencia positivamente o futuro escolar, assim como outras dimensões de bem-estar. Investir nessa etapa é estratégico para o desenvolvimento do país”.
O desenvolvimento do estudo ocorreu a partir da análise de 4.927 pesquisas publicadas desde 1988. Somente 27 atenderam aos critérios rigorosos definidos pela equipe, resultando na avaliação detalhada de 40 intervenções. A maior parte das investigações abordou habilidades cognitivas (72%), com foco em literacia e linguagem (63%) e numeracia (9%). Apenas 3% analisaram habilidades socioemocionais, tendência que contrasta com a BNCC, documento que orienta aprendizagens essenciais em dimensões física, emocional, cognitiva e social.
O relatório também destacou que a duração e o foco direto nas crianças aumentam a eficácia de programas educacionais. Intervenções contínuas, com atividades práticas como leitura compartilhada, alfabetização lúdica, exercícios físicos regulares e ações de nutrição e saúde, apresentaram impactos mais robustos quando mantidas por mais de seis meses, com carga entre 20 e 40 horas semanais. Iniciativas implementadas após a BNCC mostraram resultados ainda mais consistentes, indicando que o referencial curricular fortaleceu o trabalho pedagógico.
A análise regional revelou forte concentração de pesquisas rigorosas no Sudeste (63%) e Nordeste (26%), com destaque para São Paulo, Rio de Janeiro e Ceará. As regiões Norte e Centro-Oeste apareceram com um estudo cada uma, ambos baseados em dados secundários, enquanto o Sul registrou apenas um trabalho no Rio Grande do Sul. Essa distribuição desigual reflete limitações de financiamento e reduz a representatividade nacional. Eduardo afirmou: “A consequência é que falta representatividade nacional nas evidências sobre o impacto da pré-escola, o que limita o desenho de políticas públicas que considerem a diversidade regional do país”.
O estudo buscou ainda estabelecer conexão direta entre evidências e formulação de políticas públicas. As recomendações incluíram ampliar pesquisas em diferentes realidades, analisar custos e sustentabilidade das intervenções, realizar acompanhamentos de longo prazo e fortalecer a formação docente com ênfase em competências socioemocionais.